A dupla tributação económica dos lucros distribuídos e mecanismos de mitigação

Entenda a dupla tributação sobre dividendos e como minimizar os seus efeitos. Neste artigo André Lajoso explora as opções de planeamento fiscal para investidores, destacando a importância de analisar cada caso individualmente.

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Aquando do término de um exercício contabilístico, e depois de apurado um resultado líquido positivo, o mesmo pode ser alocado a rubricas de capitais próprios – resultados transitados para cobertura de prejuízos, reservas, etc – ou servir de remuneração aos investidores, sob a forma de dividendos.

A distribuição de dividendos a investidores residentes gera o fenómeno conhecido como dupla tributação económica de lucros distribuídos. Esse cenário ocorre porque os lucros das pessoas coletivas são inicialmente tributados em IRC e, posteriormente, são novamente tributados quando distribuídos aos titulares do capital, classificados como rendimentos de capital.

Analisando apenas a detenção de capital por residentes, podemos concluir que – quando um dividendo é distribuído – será tributado em IRS, caso o investidor seja particular, ou em IRC, caso se trate de uma pessoa coletiva.

De forma global, podemos dizer que os dividendos estão sujeitos a uma taxa liberatória de 28% em IRS e a uma retenção na fonte de 25% em IRC. Contudo, há nuances que devem ser analisadas:

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Detenção de capital por investidores particulares

A distribuição de dividendos a investidores particulares sujeitos passivos de IRS está sujeita a tributação neste imposto, à taxa liberatória de 28%, prevendo-se esta situação na alínea b) do n.º 1 do Artigo 71.º do CIRS: «Os rendimentos de valores mobiliários pagos ou colocados à disposição dos respetivos titulares, residentes em território português, devidos por entidades que não tenham aqui domicílio a que possa imputar-se o pagamento, por intermédio de entidades que estejam mandatadas por devedores ou titulares ou ajam por conta de uns ou outros».

Mais, da análise ao Artigo 40.º-A do mesmo código, acerca do englobamento dos rendimentos, os lucros devidos por sujeitos passivos não isentos de IRC e englobados em sede de IRS, são apenas considerados em 50% do seu valor. Assim, num caso prático simples, se o Sr. A detém 60% da sociedade X, Lda. e os sócios desta deliberam uma distribuição global de 50.000,00 €, então o Sr. A será tributado sobre 15.000,00€, caso opte pelo englobamento do rendimento (50.000 x 0,6 x 0,5).

Desta feita, o não englobamento só se torna interessante para sujeitos passivos integrados em declarações de IRS cuja taxa marginal ultrapasse os 56% – e, neste momento, não existem taxas marginais superiores a 53%, aplicáveis a rendimentos superiores a 250.000 euros (48% + 5% de taxa adicional de solidariedade). Por conseguinte, qualquer que seja o rendimento do sujeito passivo de IRS, pode ser interessante a análise ao englobamento dos rendimentos obtidos através da distribuição de resultados.

Não obstante, nesta análise deverá ainda ser contemplado o Artigo 22.º de onde resulta, no seu N.º 5, que «quando o sujeito passivo exerça a opção referida no n.º 3 [opção pelo englobamento], fica, por esse facto, obrigado a englobar a totalidade dos rendimentos da mesma categoria de rendimentos».

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Estando numa análise à distribuição de dividendos, enquadramo-nos na categoria E de IRS: Rendimentos de capitais. Desta forma, caso o sujeito passivo tenha outros rendimentos expressivos, de englobamento facultativo, que se tornem de englobamento obrigatório com a inclusão dos dividendos, esta opção já é de repensar.

Analisando um caso prático: o Sr. B tem, num determinado ano, um rendimento coletável global não isento de 22.000,00 € (sem retenções na fonte nem deduções especificas). Este montante não inclui os seguintes rendimentos de capitais, de englobamento facultativo:

  • Juros devidos por instituição bancária – Rendimento de 37.500,00 € – Retenção na fonte de 10.500,00€;
  • Dividendos distribuídos por sujeito passivo de IRC– Rendimento de 10.000,00 € – Retenção na fonte de 2.800,00 €.

Neste caso, é relativamente elementar entender que o englobamento não compensa. Isto porque, caso o Sr. B não englobe, e tenha um rendimento coletável de 22.000,00 €, terá uma coleta total de aproximadamente 5.134,79 € (utilizando a tabela simplificada: 22 000 x 35% – parcela a abater).

Contudo, se optar por englobar os rendimentos da categoria E, apresenta-se agora com um rendimento de 64.500,00 € (22.000 + 37.500 + 10.000 x 0,5). Este rendimento coletável dará origem a uma coleta total de 22.848,44 € (64.500 x 45% – parcela a abater) aos quais, subtraindo as retenções na fonte de 13.300,00 € e ignorando as eventuais deduções à coleta, apresenta-se num valor a pagar de 9.548,44 €.

Nota ainda para as sociedades abrangidas pelo regime da transparência fiscal, onde não ocorre a dupla tributação, uma vez que tais empresas não são tributadas em sede de IRC (exceto em relação às Tributações Autónomas). Nesse caso, o lucro tributável é imputado aos sócios, sendo estes os únicos responsáveis pela tributação nas suas esferas pessoais.

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Detenção de capital por investidores institucionais

A detenção de capital por investidores institucionais, neste âmbito, será confundida com a detenção de capital por uma sociedade sujeita a IRC – que se revela muito mais eficiente ao nível da eliminação da dupla tributação. Isto graças ao mecanismo de eliminação previsto no Artigo 51.º do CIRC, o Participation Exemption.

Este mecanismo consagra que, sempre que uma entidade sujeita e não isenta de IRC (ou imposto equivalente na União Europeia) distribui lucros ou reservas ao seu sócio sujeito passivo de IRC, este rendimento não concorre para a determinação do lucro tributável da empresa-mãe – desde que a participação detida seja superior a 10%, que esta tenha sido detida, de forma ininterrupta, durante um ano (ou, se há menos, que seja mantida em portfólio durante esse período), e que não esteja ao abrigo do regime da transparência fiscal.

Esta ‘borla’ fornecida pelo CIRC permite que, uma vez chegado o rendimento à empresa-mãe, esta não seja novamente tributada em IRC pelo dividendo distribuído.

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Mais, há ainda a questão da retenção na fonte a analisar. Isto porque, à partida, quando uma sociedade distribui dividendos a outra, está sujeita a uma retenção na fonte a título definitivo de 25%, de acordo com o n.º 4 do Artigo 94.º do CIRC. Esta retenção na fonte pode, posteriormente, ser aproveitada como pagamento por conta de imposto na hora do seu apuramento.

Contudo, quando estamos no regime da participation exemption, temos também de abordar a alínea c) do n.º 1 do Artigo 97.º, que dispensa a retenção na fonte os lucros e reservas distribuídos a que seja aplicável a isenção acima referida. Neste campo, também ficam dispensados de reter na fonte os juros e suprimentos devidos por sociedade detida em mais de 10% pela entidade a eles tem direito, durante o período ininterrupto de um ano.

A verdade é que os códigos fiscais estão preparados para absorver a dupla tributação dos lucros distribuídos nos casos de entidades sujeitas a IRC, mas apenas dispõem de mecanismos de absorção/atenuação desta dupla tributação, quando se fala em IRS – talvez pelo facto de os montantes transitarem entre sociedades, e não para esfera pessoal alguma. Principalmente em IRS, estes mecanismos têm de ser devidamente estudados pelo sujeito passivo, de forma a fazer um planeamento fiscal eficiente, mitigando o imposto a liquidar.

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