O Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) constitui uma oportunidade ímpar para a transformação da Administração Pública (AP) e dos serviços públicos, mas deve ir muito mais além da mera transformação tecnológica.
Deve ser um trampolim de inovação para Estado, empresas e cidadãos que permita a todos ambicionar digitalizar, capacitar, empreender e investir naquilo que demoraria várias décadas a alcançar, mas que agora pode ser conseguido em apenas cinco anos.
A Estratégia para a Transformação digital da Administração Pública 2021-2026, aprovada a 26 de agosto de 2021, tem como uma das suas grandes metas tornar a AP mais eficaz e eficiente na resposta às necessidades e expectativas dos cidadãos e das empresas, através da prestação de serviços mais simples, integrados e inclusivos – criando condições para uma operação que tira o máximo partido do potencial de transformação disponibilizado pelas tecnologias digitais e a utilização inteligente dos dados.
Para o cumprimento dessa estratégia a cinco anos, o PRR tem disponíveis verbas que ascendem aos 578 M€, só para a componente 19, que abarca a “Transição Digital Da Administração Pública: Capacitação, Digitalização, Interoperabilidade e Cibersegurança”.
Três grandes eixos de atuação
As medidas e iniciativas inscritas no PRR têm como principais objetivos a redução de custos de contexto e a melhoria da qualidade dos serviços públicos, centrando-se em 3 grandes eixos de atuação: Centricidade no Cidadão; Digitalização dos Serviços às Empresas; e Capacitação dos Trabalhadores do Setor Público.
A concretização destes objetivos coloca à AP grandes desafios na modernização dos fluxos e processos centrados nas necessidades dos cidadãos e das empresas, uma vez que as suas expectativas – à imagem do que acontece noutros setores – passam por serviços públicos integrados e omnicanal, que lhes poupem tempo, resolvam os seus problemas e necessidades e criem experiências que os satisfaçam.
Os cidadãos e as empresas querem uma AP ágil, fácil de compreender e que comunique de forma simples e eficaz. O Estado deve ter um papel facilitador e de melhoria contínua na vida dos cidadãos e das empresas. Esta mudança deve ser acompanhada por uma capacitação das equipas da AP, no sentido de renovar conhecimentos e competências capazes de inovar e sustentar novas formas de trabalhar suportadas numa cultura digital de agilidade e inovação.
“Se bem aproveitado, este PRR pode colocar os serviços públicos no centro da excelência em inovação”
Oito ideias para alavancar a transformação digital do Setor Público através do PRR
1 | Iniciativas de transformação digital
Ajudar os organismos públicos a adotarem novas tecnologias (software de gestão de informação, plataformas online para acesso a serviços públicos, utilização de IA e automatização de processos, etc.) que melhorem as suas operações e boas práticas. Paralelamente, capacitar e apoiar os trabalhadores do Estado ao longo de todo o processo de mudança (novos processos, formatos e metodologias de trabalho).
2 | Melhoria do serviço aos cidadãos
A racionalização e automatização dos processos permitem aos organismos públicos fornecer serviços mais rápidos, transparentes e convenientes aos cidadãos, o que ajuda a construir uma relação de maior confiança e satisfação com o setor público.
3 | Redução de custos
A tecnologia aplicada à automatização de processos manuais (introdução de dados, manutenção de registos ou gestão de documentos, etc.) reduz o tempo, os recursos, os processos e o custo associados à prestação de serviços. A adoção de plataformas “zero-code” tem desempenhado um papel preponderante nesta matéria.
4 | Colaboração e comunicação sem barreiras
A tecnologia permite melhorar a interação e o fluxo de informação entre diferentes organismos e serviços com diferentes procedimentos e intervenientes no Estado, permitindo-lhes trabalhar em conjunto de forma mais eficaz na prestação de serviços aos cidadãos, através de uma melhor interoperabilidade.
5 | Tomada de decisões data-driven
A tecnologia pode ser utilizada para recolher, armazenar e analisar grandes quantidades de dados que dão origem a informação relevante (com elevado grau de rigor, controlo, realismo e certeza) para identificação de padrões, previsão de tendências e tomadas de decisão mais céleres e informadas.
6 | Foco na segurança e na privacidade
Mais do que nunca, é importante proteger a privacidade dos cidadãos (dados pessoais, informações financeiras, documentos confidenciais, etc.), reduzir o risco de violação de dados, monitorizar e prevenir as atividades suspeitas e ataques virtuais, através criptografia, autenticação de utilizadores, entre outras práticas de segurança realizadas hoje de forma mais precisa e confiável graças à tecnologia.
7 | Mais transparência e responsabilização
A tecnologia aumenta a transparência das operações governamentais e torna mais fácil aos cidadãos responsabilizar as agências governamentais pelas suas ações e decisões. Isto ajuda a aumentar a confiança no setor público e melhora a sua reputação – o que fomenta a participação ativa dos cidadãos fortalece a democracia.
8 | Fomentar a inovação
Encorajar o desenvolvimento de novas soluções e abordagens para os desafios do setor público leva à criação de novos empregos, ao crescimento económico, a um maior poder de compra e ao aumento da competitividade do país no mercado global.
Se bem aproveitado, este PRR pode ser o instrumento que reposiciona Portugal e os serviços públicos portugueses no centro da excelência em tecnologia e inovação.
Em conjunto com os hubs tecnológicos, as startups e as organizações tecnológicas – que dão cartas cá dentro e lá fora – assim como as universidades, os centros de investigação e as incubadoras – que são já motor de conhecimento e colaboração – temos mais do que suficiente para afastar Portugal da malfadada ‘cauda’ e preferirmos ser antes a ‘cabeça’ da Europa – um conceito que já Camões e Pessoa ambicionavam nos seus versos, muito antes de imaginarem e comprovarem tudo o que a tecnologia é (e será) capaz de fazer para melhorar a vida dos cidadãos e transformar a sociedade.